domingo, 22 de maio de 2011

A USP não pode ser gratuita

Por: Tom Coelho

"O importante da educação não é o conhecimento dos fatos,mas dos valores."
(Dean William Inge)


O assassinato de um estudante nas dependências da Universidade de São Paulo,
além de causar comoção e preocupação, deve também resgatar um debate há
muito negligenciado: as universidades públicas não podem continuar
integralmente gratuitas.

USP, Unesp e Unicamp conquistaram em 1989 a chamada autonomia financeira
recebendo repasses do Governo da ordem de 9,57% da receita líquida do ICMS.
Portanto, é dinheiro público, de um Estado formado por mais de 41 milhões de
habitantes (Censo 2010), para beneficiar cerca de 210 mil pessoas, entre
estudantes, funcionários e docentes.

Diante desta informação, toda discussão acerca da abertura dos portões da
USP ao público em geral e sobre a participação da polícia militar em rondas
ostensivas é improcedente. A população tem direito de acesso a um espaço
comum. A polícia deve prover segurança à Cidade Universitária como deve
fazê-lo em qualquer outra localidade.

Os defensores da universidade pública integralmente gratuita alegam, com
razão, que a educação é um direito do cidadão e um dever do Estado.
Argumentam também que muitos ingressantes cursaram o ensino médio em escolas
privadas com a finalidade de, melhor preparados, obterem sucesso no concurso
vestibular. Ouvi estas e outras teses em minha passagem pela USP, nos anos
1990, arduamente defendidas pelos pseudoesquerdistas do Diretório Central de
Estudantes (DCE) e de diversos Centros Acadêmicos.

O fato é que muitos estudantes lutam, sim, para ingressar em uma destas
universidades não apenas por sua qualidade de ensino e reputação, mas também
porque não poderiam pagar pelos estudos. Refiro-me a alunos que usam
transporte público, frequentam assiduamente as bibliotecas para fugir da
aquisição de livros, dividem espaço em repúblicas ou conjuntos habitacionais
com vários outros colegas ao longo de quatro ou cinco anos.

Contudo, há um número expressivo de estudantes oriundos das classes A e B,
com renda familiar mais do que suficiente para custear seus estudos e que se
locomovem em veículos próprios, desfilam roupas de grife e lotam os bares
nos arredores da faculdade sem preocupação com o valor da conta.

Tomemos como exemplo os estacionamentos em todas as faculdades da USP. São
mal iluminados, sem monitoramento eletrônico e vigilância policial. Diante
disso, cabe ao poder público investir em postes de iluminação, câmeras e
policiamento, ou cabe aos proprietários de veículos se cotizarem para suprir
estas necessidades? Por que aqueles que pagam despreocupadamente R$ 20,00 ou
mais para estacionar seus veículos com um manobrista julgam absurdo pagar
uma mensalidade para guardarem seus carros com segurança?

O fim da gratuidade não significa necessariamente a cobrança de
mensalidades. Este expediente pode ser aplicado a alguns alunos, mas o fato
é que todos, indistintamente, deveriam legar à sociedade parte do que dela
receberam. Por que os estudantes de Direito do Largo São Francisco não
advogam para a população carente? Por que os engenheiros da Poli não
realizam ações de urbanização de favelas? Por que os profissionais da área
de saúde não reforçam o atendimento nos postos de saúde e prontos-socorros?

É uma questão de vontade política, consciência moral e valores virtuosos. Os
trabalhos de conclusão de curso, estágios e que tais deveriam ser cumpridos
em atendimento à comunidade. Os graduados deveriam destinar um dia por mês
ao longo de um ano, no mínimo, para trabalho assistencial. Mas é mais fácil
fechar os olhos para a favela São Remo, proibir o acesso de "pessoas
diferenciadas" no campus ou até mesmo erguer muros e instalar cancelas,
praticando o segregacionismo.

Basta de hipocrisia!


* Tom Coelho é educador, conferencista e escritor com artigos publicados em
15 países. É autor de "Sete Vidas - Lições para construir seu equilíbrio
pessoal e profissional", pela Editora Saraiva, e coautor de outros quatro
livros. Contatos através do e-mail
tomcoelho@tomcoelho.com.br. Visite:
www.tomcoelho.com.br e www.setevidas.com.br.

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